"Cabeças em simetria exibidas ao público na escadaria da Prefeitura de Piranhas, Alagoas, algumas apoiadas por calços de pedra, cabelos desgrenhados, feições rígidas, olhos fechados. A ordem de apresentação do escalão é inversa e quebra a hierarquia que tiveram em vida. No plano mais baixo, isolada, a cabeça de Lampião; acima, a de Maria Bonita, tendo à direita a de Luís Pedro e à esquerda Quinta-Feira; degrau acima, as cabeças dos cangaceiros Mergulhão, Elétrico e Caixa de Fósforo; no plano mais alto, as cabeças de Enedina, Cajarana, um cangaceiro não identificado, dito “desconhecido” e o cangaceiro Diferente.
A cena parece forjada para conjurar o espectro dos cangaceiros e de tudo o mais que representam. As arrumações reforçam uma imagem de Lampião solitário, que não mais detém o comando do grupo. Ademais, rompe com a imagem à época já lendária do casal Lampião e Maria Bonita, pois esta não aparece ao seu lado. Para tanto, a contemplação fúnebre não é suficiente. Alocam-se nos espaços da escadaria os pertences dos mortos. Pelo modo como são expostos, não identificam seus donos, seus usuários. Identificam, contudo, o espólio material do cangaço. No plano superior, à esquerda e à direita, duas máquinas de costura marca Singer. Ao centro, artefatos de couro. Ladeando as cabeças, pistolas, mosquetões e punhais longos e medianos; chapéus de couro com abas viradas, pontuados com estrelas em diferentes padrões. Um dos chapéus repousa sobre uma caixa com a marca registrada da empresa petrolífera inglesa Standar Oil Company of Brazil, inscrição somente identificada quando colocada a imagem de baixo para cima. Embornais, cartucheiras, peças da indumentária adornada com moedas de ouro e traços geométricos".
Marcos Edílson de Araújo Clemente, em "Cangaço e cangaceiros: histórias e imagens fotográficas do tempo de Lampião".
quinta-feira, 5 de agosto de 2010
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